11/12/23

BANDEIRAS REVOLUCIONÁRIAS: MOLDÁVIA

Certas bandeiras têm histórias tão exitosas que ultrapassam fronteiras.

Tudo que eu disse sobre a bandeira da Romênia vale para a da Moldávia, pois neste caso a mesma tricolor não se deve a uma coincidência, como no caso de Andorra e do Chade, mas ao fato de os romenos e moldavos comungarem história, língua e cultura. Portanto, aqui cabe apontar os momentos de convergência e divergência que levaram à bandeira moldava hodierna.

Bandeira da Moldávia.
Bandeira da Moldávia.

Em primeiro lugar, cumpre observar que a Moldávia é maior que a república desse nome. É que essa região foi partida três vezes: em 1775, a Áustria arrebatou a parte mais alta (Țara de Sus 'Terra de Cima'), desde então dita Bucovina; em 1812, a Rússia tomou o território entre os rios Nistru e Prut, desde então dito Bessarábia; em 1940, a União Soviética definiu as fronteiras atuais.

Em compensação, a Moldávia uniu-se à Valáquia em 1859, impondo-se o nome oficial de Principados Unidos Romenos e o comum de Romênia. Esse estado declarou a sua independência do Império Otomano em 1877 e elevou-se a reino em 1881. Tendo a Revolução de Fevereiro derrubado a monarquia russa, o Conselho Nacional (Sfatul Țării) declarou que a Bessarábia constituía a República Democrática da Moldávia em dezembro de 1917, a independência em fevereiro do mesmo ano e a união com a Romênia em abril de 1918, a qual os romenos denominam Marea Unire ('a Grande União'), pois abrangeu a Bucovina e a Transilvânia.

A reunificação da Moldávia durou até o dito ano de 1940, quando a Romênia evacuou a sua administração da Bessarábia e da Bucovina setentrional, obedecendo ao ultimato da União Soviética. Esta agia ao amparo dos protocolos secretos do chamado Pacto Molotov–Ribbentrop, pelo qual repartira o leste europeu com a Alemanha no ano antecedente. Uma comissão traçou, então, uma fronteira: no território onde os romenos somavam 75% da população ou mais, constituiu-se a República Socialista Soviética Moldava, inclusive além do Nistru; o resto do território foi anexado à República Socialista Soviética Ucraniana.

O regime socialista começou a ser desmontado pelas eleições ao Soviete Supremo em março de 1990, o qual renomeou o estado República da Moldávia e a si mesmo parlamento em maio de 1991, declarou a independência em agosto do mesmo ano e adotou nova constituição em 1994.

Portanto, os moldavos vivem há muito tempo entre duas forças antagônicas. De um lado, o nacionalismo romeno, que se desenvolveu com base na origem latina do idioma, ocidentalizando o país a partir de uma intensa francofilia. Do outro, o expansionismo russo nos Bálcãs, que sob a monarquia se justificava pela proteção dos cristãos ortodoxos no Império Otomano e sob o socialismo pela propagação da revolução.

Em especial, durante o período soviético houve uma russificação opressiva na República Socialista Soviética Moldava. Um dos seus vários aspectos era alienar os moldavos da identidade romena: a língua foi renomeada moldava e era escrita no alfabeto cirílico russo. O extremo desse processo está no território à margem esquerda do Nistru, onde outro aspecto dessa russificação — a migração de russos e ucranianos — propiciou a separação da República Moldava Nistreana (Pridnestrovskaja Moldavskaja Respublika em russo) dois dias antes da independência da República da Moldávia. A chamada Transnístria (ou Pridnestróvia) é sustentada pela Rússia, ainda que nem mesmo esta a reconheça.

Bandeira militar da Moldávia (modelo de 1834; imagem disponível na Wikimedia Commons).
Bandeira militar da Moldávia (modelo de 1834; imagem disponível na Wikimedia Commons).

Antes da união com a Valáquia e como a este principado, Mamude II concedeu um pavilhão mercante à Moldávia em 1834, a pedido do príncipe Miguel Sturdza. Este, no decreto pelo qual tornou público o ato do sultão, descreve uma "bandieră cu marca națională, adică, cap de bou cu stele, iar colorul, parte roșu și parte vânăt" ("bandeira com a marca nacional, isto é, uma cabeça de boi com estrelas, e a cor, em parte vermelha e em parte índigo"). Essa descrição não basta, porém, para determinar se refere à bandeira militar de que remanescem alguns exemplares ou ao pavilhão que Alexandre Le Gras dá no Album des pavillons, guidons, flammes de toutes les puissances maritimes (1858).

Pavilhão mercante da Moldávia no Album des pavillons... (1858), de Alexandre Le Gras. (1)
Pavilhão mercante da Moldávia no Album des pavillons... (1858), de Alexandre Le Gras. (1)

A bandeira militar era azul com o encontro de uro (capul de bour), encimado de uma estrela de oito raios, o todo encerrado numa capela de ramos de oliveira e encimado pela coroa principesca, e em cada ângulo um quadrado vermelho com uma estrela branca de oito raios. O reverso diferia: trazia a imagem de São Jorge e o monograma do príncipe em cada quadrado. O pavilhão também era azul com o encontro de uro, mas em vez dos quadrados, tinha um cantão vermelho e nele as estrelas, que somavam três.

É verdade que os regulamentos orgânicos, um outorgado pelo sultão e pelo tsar à Valáquia em 1831 e o outro à Moldávia no ano seguinte, estabeleceram bandeirolas de lança bicolores, amarela e azul para a milícia valaca e vermelha e azul para a moldava, e que depois se difundiria amplamente serem elas as bandeiras desses principados e a sua combinação, a origem da tricolor. Todavia, parece-me mais significativo que no edito de Mamude II se descreva a águia valaca como "pasăre albastră" ("pássaro azul") e nos exemplares remanescentes da bandeira militar moldava o encontro de uro apresente a cor amarela.

Tendo em conta que as estrelas sobre vermelho representavam incontestavelmente a suserania otomana, as três cores estavam presentes nas bandeiras de ambos os principados e, embora já compusessem a bandeira militar valaca na forma de faixas desde 1835, puderam, então, denotar a sua união a partir de 1861. Mais que isso: a tricolor tornou-se a bandeira do povo romeno, tanto na Romênia como na Rússia e sob a monarquia dos Habsburgos.

Estandarte do Regimento de Infantaria n.º 1 da República Democrática Moldava (conservado em Muzeul Militar Național, Bucareste; imagem disponível no jornal Noi).
Estandarte do Regimento de Infantaria n.º 1 da República Democrática Moldava (conservado em Muzeul Militar Național, Bucareste; imagem disponível no jornal Noi).

Assim, durante a breve idade da República Democrática Moldava foram bandeiras azuis, amarelas e vermelhas que se agitaram, mas de faixas horizontais. E novamente depois do longo período socialista: em abril de 1990, o Soviete Supremo passou a lei que restaurou a tricolor, mas de faixas verticais, com as armas estatais no centro da amarela. A lei vigente sobre a forma e o uso da bandeira da Moldávia foi passada em 2010. Além da presença do brasão, diferencia-se da romena pelas tonalidades das cores e pela proporção de 1:2.

Armas da Moldávia (imagem disponível no site da Presidência da República).
Armas da Moldávia (imagem disponível no site da Presidência da República).

Como na Romênia, as armas da República da Moldávia têm uma relação especial com a bandeira. O encontro de uro está atestado desde 1387, mas devido ao desenvolvimento tardio da heráldica na região, as reproduções em cores apresentam grande variação. Em 1921, o rei Fernando da Romênia o fixou de negro, com a estrela, a rosa e o crescente de ouro, em campo de vermelho. Em novembro de 1990, o Soviete Supremo da Moldávia o fixou de ouro, como a estrela, a rosa e o crescente, sobreposto a um campo cortado de vermelho e azul, ou seja, as mesmas cores da bandeira. Curiosamente, esse escudo repousa sobre o peito de uma águia semelhante à valaca, já que tem uma cruz no bico e um cetro na garra esquerda, mas é interpretada como uma águia romana.

Nota:
(1) Segundo o autor, "la Moldavie n'a pas de marine de guerre. Ce pavillon est celui des quelques bâtiments de commerce armés au port de Galatz. Le pavillon des milices de la Moldavie est à deux bandes horizontales rouge et bleue (la rouge supérieure), avec la tête de bœuf dans un jack à fond blanc, auprès de la hampe, dans la partie supérieure du guindant" ("a Moldávia não tem marinha de guerra. Esse pavilhão é aquele de alguns barcos de comércio armados no porto de Galați. O pavilhão das milícias da Moldávia é de duas faixas horizontais vermelha e azul (a vermelha superior), com a cabeça de boi num jaque de fundo branco, junto à tralha, na parte superior da guinda").

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