02/07/21

A JUSTIFICAÇÃO DE UM FIDALGO DE LINHAGEM NA MONARQUIA CONSTITUCIONAL

As monarquias constitucionais de Portugal e do Brasil adaptaram certos aspectos, mas a heráldica gentilícia permaneceu essencialmente a mesma do Antigo Regime.

O segundo processo de justificação de nobreza que transcreverei aqui tem por justificante José Inácio de Oliveira Rebelo e tramitou de 25 de fevereiro a 11 de abril de 1843. A carta de brasão foi-lhe passada em 7 de junho do mesmo ano. Como o anterior, esse processo também ilustra o caso de alguém que não possuía título nobiliário nem era fidalgo filhado por Sua Majestade para o serviço de Sua Casa, mas agora sob a monarquia constitucional. Na verdade, o procedimento continuou essencialmente o mesmo do Antigo Regime, diferindo apenas os fatos de que a Correição do Cível da Corte deu lugar ao Juízo de Direito de Lisboa, que não mais o monarca por intermédio do corregedor, mas o próprio juiz em nome do monarca proferia a sentença e que se suprimiram ou adaptaram palavras e expressões referentes a conceitos do Antigo Regime. Além disso, esse exemplo é interessante por mostrar que o pretendente tinha de constituir um procurador caso não morasse em Lisboa. Da procuração parece depreender-se que o fim primeiro dele era pôr uma pedra de armas na capela que ficava na sua propriedade e administrava.

LISBOA, JUÍZO DE DIREITO, SEXTA VARA

INSTRUMENTO CÍVEL DE JUSTIFICAÇÃO, PASSADO A FAVOR E REQUERIMENTO DE JOSÉ INÁCIO DE OLIVEIRA REBELO, PARA O FIM DE QUE NO MESMO SE CONTÉM E DECLARA.

O Doutor João de Campos Pereira Barreto, Cavaleiro Professo na Ordem de Cristo, Juiz de Direito da Sexta Vara nesta Comarca de Lisboa e seu termo, com alçada por Sua Majestade Fidelíssima, a Rainha, a Senhora Maria Segunda, que Deus guarde, a todos os doutores, juízes de direito, justiças, oficiais e mais dela destes Reinos e seus Domínios, àqueles a quem, onde e perante quem e a cada um dos quais o presente instrumento cível de justificação em forma virem e lhe for apresentado e o verdadeiro conhecimento dele com direito direitamente deva e haja de pertencer o seu devido efeito, inteiro e plenário cumprimento e real execução dele e com ele, da parte de Sua Majestade Fidelíssima, a Rainha, a Senhora Dona Maria Segunda, que Deus guarde, se vos pedir e requerer por qualquer via, forma, maneira ou razão que seja ou ser possa em direito, melhor lugar haja e mais firme e valioso for, faço-lhes saber a todos em geral e a cada um em particular em suas respetivas jurisdições, vilas, comarcas e distritos, como nesta Corte e muito Nobre e sempre Leal Cidade de Lisboa e Juízo de Direito da Sexta Vara, perante mim, como juiz do sobredito juízo, e cartório do escrivão, que este subscrevo, se trataram, correram, processaram e, finalmente, foram por mim julgados e sentenciados uns autos cíveis de justificação, ordenados e processados, como justificante José Inácio de Oliveira Rebelo.

E visto tudo sobre e em razão do conteúdo escrito e declarado em os ditos autos, dos quais ao diante e pelo decurso do presente se irá fazendo mais larga, expressa, declarada menção. E pelos ditos autos e seus termos, deles se via e mostrava estar, logo a seu princípio, o auto de autuação, do qual todo o seu teor é pelo modo e maneira seguinte:

Ano do nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo de mil oitocentos quarenta e três, aos vinte e cinco de fevereiro, em Lisboa e no meu escritório, assinei a petição que se segue, de que fiz este auto de autuação, que eu, Daniel José da Silva Melo, o escrevi.

Segundo se continha em o mencionado auto de autuação, que sendo assim feito, do modo que dito fica e dos autos consta.

Dos mesmos, outrossim, mais se via estar a petição, da qual todo o seu teor e forma é pelo modo e maneira seguinte:

Ilustríssimo Senhor,
Diz José Inácio de Oliveira Rebelo, proprietário e administrador da Capela de Nossa Senhora das Mercês, da vila de Granja do Tedo, concelho de São Cosmado, comarca de Tabuaço, que para poder requerer o seu brasão d'armas, precisa justificar perante Vossa Senhoria os itens seguintes: primeiro, que o suplicante é filho legítimo de José António de Oliveira e Dona Luísa Josefa Lopes de Oliveira, da mesma vila; segundo, que é neto paterno de Manuel Dias de Oliveira e de sua mulher, Dona Sebastiana de Oliveira; terceiro, que é neto materno de Manuel Lopes e sua mulher, Dona Josefa Maria de Oliveira; quarto, que é atual administrador da Capela de Nossa Senhora das Mercês, a qual tem na sua própria casa, com Santíssimo Sacramento, e que fora instituída pelos seus antepassados, e que descende de família do Padre José Teixeira, vigário de Nagosa, ao qual foi concedido, em vinte de abril de mil setecentos quarenta e cinco, brasão de armas dado à família de Teixeiras, Ferreiras e Barbudas, como se pode ver no Livro Dois do Registo dos Brasões, a folhas duzentas; quinto, que tanto o suplicante como os referidos seus pais, avós e mais ascendentes são pessoas nobres, que sempre se trataram à lei da nobreza, servindo os lugares mais nobres da República, e nunca cometeram crime de lesa-majestade, divina ou humana. Portanto, pede a Vossa Senhoria, Ilustríssimo Senhor Doutor Juiz de Direito, que, distribuída, o admita a justificar o referido e se julgue por sentença, passando-se-lhe instrumento em forma. E receberá mercê.

Segundo se continha e declarava e era outrossim conteúdo, escrito e declarado em a dita e mencionada petição, que sendo assim feita, do modo que dito fica e dos autos consta.

Dos mesmos, outrossim, mais se via estar, na mesma petição, posto o despacho, do qual todo o seu teor é pelo modo e maneira seguinte:

Distribuído. Justifique em forma legal. Lisboa, vinte e cinco de fevereiro de mil oitocentos quarenta e três. Sá Vargas.

Segundo se continha e declarava e era outrossim conteúdo, escrito e declarado em o dito e mencionado despacho, que sendo assim dado e proferido na sobredita petição, do modo e forma que dito fica e dos autos consta.

Dos mesmos, outrossim, mais se via e mostrava estar a distribuição, da qual todo o seu teor é pela maneira seguinte:

A Melo: Audiência de vinte e cinco de fevereiro de mil oitocentos quarenta e três. Sá Vargas. Bruno.

Segundo se continha em a mencionada distribuição, que sendo assim feita, do modo que dito fica e dos autos consta.

Dos mesmos, outrossim, mais se via estar o termo de identidade e ratificação, do qual todo o seu teor é pela maneira seguinte:

TERMO DE IDENTIDADE E RATIFICAÇÃO
Aos seis de março de mil oitocentos quarenta e três em Lisboa, no meu escritório, foi presente Jacinto José da Silva, procurador de José Inácio de Oliveira Rebelo, o que mostrou pela procuração que se segue, e disse que ratificava tudo quanto seu constituinte pretendia justificar, na conformidade do artigo trezentos, parágrafo segundo, da novíssima Reforma Judiciária. E assinou com as testemunhas José Joaquim Romão da Silva e Manuel Rebelo Palhares, empregados neste escritório, moradores aquele na Rua do Capelão e este na Rua Nova da Palma. Daniel José da Silva Melo. Jacinto José da Silva. José Joaquim Romão da Silva. Manuel Rebelo Palhares.

Segundo se continha e declarava e era outrossim conteúdo, escrito e declarado em o dito e mencionado termo de identidade e de ratificação, que sendo assim feito, do modo e forma que dito fica e dos autos consta.

Dos mesmos, outrossim, mais se via e mostrava estar a procuração a que se referia o dito termo, da qual todo o seu conteúdo e forma é pelo modo e maneira seguinte:

Saibam os que este público instrumento de procuração bastante virem que no ano do nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo de mil oitocentos quarenta e três, aos quinze dias do mês de fevereiro do dito ano, nesta vila de São Cosmado e meu escritório, perante mim, tabelião, e as testemunhas ao diante nomeadas e no fim deste assinadas, apareceu presente em sua própria pessoa José Inácio de Oliveira Rebelo, da extinta vila da Granja do Tedo, deste julgado, bem conhecido e reconhecido de mim, tabelião, e das mesmas testemunhas pelo próprio, do que dou fé. E disse fazia por este seu bastante procurador a Jacinto José da Silva, da cidade de Lisboa, com poder de substabelecer e a cada um, in solidum, dá poder quanto em direito se requer para que em nome dele, outorgante, como se presente fosse, possa em qualquer juízo ou tribunal deste Reino defender e requerer toda a sua justiça em todas as causas movidas e por mover, tanto cíveis como crimes em que for autor ou réu, e, principalmente, para lhe poder tratar de uma justificação que pretende dar na dita cidade de Lisboa, para poder obter licença para pôr um padrão de armas nas suas casas e capela, que tem na dita extinta vila da Granja do Tedo, podendo assinar todos os termos e autos que necessários forem para o dito fim, fazendo citar, demandar, penhorar, oferecer ações, libelos, artigos, embargos, exceções, contrariar, dar provas, pôr contraditas e suspeições, dar testemunhas, contraditar as das partes, jurar na sua alma todo o lícito juramento e de calúnia, decisório e supletório deixá-lo na alma das partes, parecendo-lhe assinar os termos e autos necessários, protestos, contraprotestos e de ratificação de qualquer processado, requerimentos, apelar, agravar, embargar e tudo seguir até maior alçada e esta substabelecer e dela usar, assinar termos de confissões, negações, louvações e desistências, tirar sentenças e fazê-las dar à sua execução, requerer prisões, sequestros, arrematações, adjudicações, lançar nos bens dos devedores na falta de lançador e deles tomar posse, requerer precatórios, assinar de como os recebe, vir com embargos de terceiro senhor e possuidor e jurá-los, variar de ações e intentar outras de novo, assinar termos judiciais nas causas-crimes, ajuntar documentos e recebê-los, reservando a nova citação, e tudo feito e obrado por ele, procurador, e substabelecer in solidum. Promete haver por firme e valioso, por sua pessoa e bens. Assim o disse, sendo testemunhas presentes António de Carvalho, solteiro, jornalista, e seu pai, José de Carvalho, casado, oficial de sapateiro desta mesma vila, que reconheço pelos próprios, de que dou fé, e que assinaram com o outorgante. E eu, José Inácio de Figueiredo, tabelião que o subscrevi e assinei de meu sinal público e raso, de que uso neste julgado, comarca de Tabuaço. José Inácio de Oliveira Rebelo. José de Carvalho. António de Carvalho. Lugar do sinal público. Em testemunho de verdade. José Inácio de Figueiredo. Reconhecimento. Reconheço o sinal em frente do tabelião. Lisboa, dois de março de mil oitocentos quarenta e três. Lugar do sinal público. Em testemunho de verdade. José Batista Scola.

Segundo se continha em a mencionada procuração, que sendo assim feita, do modo que dito fica e dos autos consta.

Dos mesmos, outrossim, mais se via estar a certidão de notificação, que da qual todo o seu teor e forma é pelo modo e maneira seguinte:

Notifiquei em suas próprias pessoas, que conheço, e para comparecerem no Tribunal da Boa Hora, pelo meio-dia, a Narciso José Gomes do Souto, Manuel Joaquim de Carvalho, Francisco Gomes de Carvalho, do que ficaram cientes. Lisboa, seis de março de mil oitocentos quarenta e três. Daniel José da Silva Melo.

Segundo se continha e declarava e era outrossim conteúdo, escrito e declarado em a dita e mencionada certidão de notificação, que sendo assim feita, do modo que dito fica e dos autos consta.

Dos mesmos, outrossim, mais se via e mostrava estar a justificação, da qual todo o seu teor é pela maneira seguinte: 

JUSTIFICAÇÃO DE JOSÉ INÁCIO DE OLIVEIRA REBELO
Aos seis dias do mês de março de mil oitocentos e quarenta e três anos, em Lisboa e Casas da Boa Hora, onde comigo, escrivão, veio o Doutor João de Campos Pereira Barreto, Juiz de Direito da Sexta Vara e alçada, a requerimento de José Inácio de Oliveira Rebelo, foram inquiridas as testemunhas que se seguem: Daniel José da Silva Melo descrevi. Narciso José Gomes do Souto, casado, boticário, natural da Vila Seca, residente nesta cidade, na Rua de São Paulo, número cinco, terceiro andar, de idade de trinta e cinco anos, juramentado devidamente, prometeu dizer verdade no que fosse perguntado e, do costume, disse nada. E perguntado pelo conteúdo da petição de folhas duas, disse que sabe, pelo ouvir dizer, que o justificante, que perfeitamente conhece, é filho legítimo de José António de Oliveira e de sua mulher, Dona Luísa Josefa Lopes de Oliveira, da vila da Granja do Tedo, concelho de São Cosmado, comarca de Tabuaço. E mais não disse deste. Ao segundo, disse que, posto não conhecesse os avós do justificante, por notoriedade pública sabe que os paternos são os articulados neste artigo, assim como e pela mesma razão sabe que os avós maternos do justificante são também os articulados no artigo terceiro. E mais não disse ao segundo e terceiro. Ao quarto, disse que sabe, por ter passado naqueles sítios, visto a capela aludida e ouvido falar dela a pessoas vizinhas, que a mesma é administrada pelo justificante, instituída por seus passados e que o justificante é da família do Padre João Teixeira, a quem já em época remota fora concedido o brasão de armas. E mais não disse deste. Ao quinto, disse que sabe, pelo ouvir dizer geralmente, que o justificante e seus ascendentes sempre se trataram à lei da nobreza e andaram nos cargos principais da governança da terra, sem que conste que jamais cometessem crime, muito menos de lesa-majestade, divina ou humana. E mais não disse e assinou com o juiz. E eu, Daniel José da Silva Melo, o escrevi. Barreto. Narciso José Gomes do SoutoManuel Joaquim de Carvalho, negociante, solteiro, natural de São Cosmado, morador nesta cidade, na Rua dos Capelistas, número noventa e sete, freguesia de São Julião, de idade de trinta e quatro anos, tomou juramento, no costume disse nada. Petição, folhas duas. E perguntado pelo conteúdo da petição, disse que o justificante é filho legítimo de José António de Oliveira e de Dona Luísa Josefa Lopes de Oliveira, e neto paterno de Manuel Dias de Oliveira e de sua mulher, Dona Sebastiana de Oliveira, e neto materno de Manuel Lopes e de sua mulher, Josefa Maria de Oliveira, o que sabe por ser vizinho do justificante, do mesmo concelho e o ter ouvido dizer muitas vezes, assim como sabia, pelo ver e presenciar, que ele é administrador atual da Capela de Nossa Senhora das Mercês, ereta na freguesia da dita Granja do Tedo, na qual tem ele o Santíssimo Sacramento, donde algumas vezes sai aos enfermos, em forma de viático, e ouvira dizer geralmente, quando residente no concelho de São Cosmado, que esta capela fora instituída pelos seus maiores, bem como que o justificante descendia da família do Padre José Teixeira, vigário da Nagosa, ao qual também ouvira dizer publicamente se concedera, lá em época remota, brasão de armas; que, pelo ver e presenciar, sabe que o justificante é pessoa nobre e se tratou sempre à lei da nobreza, com cavalos e o mais próprio da sua qualidade de pessoa, tendo servido os lugares mais nobres da República, e que nunca cometera crime de lesa-majestade, divina ou humana; e, pelo ouvir dizer geralmente, outro tanto diz de seus pais e avós. E mais não disse. E assinou com o juiz. Daniel José da Silva Melo, o escrevi. Barreto. Manuel Joaquim de CarvalhoFrancisco Gomes de Carvalho, cavaleiro da Ordem de Nossa Senhora da Conceição de Vila Viçosa, delegado do procurador régio da comarca de Moimenta da Beira, deputado em Cortes, solteiro, de idade de quarenta e cinco anos, juramentado devidamente, do costume disse nada. Petição, folhas duas. E perguntado pela petição, disse que sabe, pelo ver, que o justificante é filho legítimo de José António de Oliveira e de sua mulher, Dona Luísa Josefa Lopes de Oliveira, da vila da Granja do Tedo, concelho de São Cosmado, comarca de Tabuaço, e que, pelo ouvir dizer geralmente, sem fama em contrário, sabe que é neto paterno de Manuel Dias de Oliveira e de sua mulher, Dona Sebastiana de Oliveira, e materno de Manuel Lopes e de sua mulher, Dona Josefa Maria de Oliveira, e que, pelo ver, sabia ser ele administrador da Capela de Nossa Senhora das Mercês, pois que sendo ele, testemunha, administrador do seu concelho, até já lhe mandara passar quitação de cumprimento de seus encargos; que nela tinha ele e tiveram seus maiores o Santíssimo Sacramento, sustentado com suas próprias despesas, indo até dela em forma de viático aos enfermos quando, por causa do mau tempo, não pode ir da igreja matriz; que, pelo ouvir dizer, sabia que esta capela fora instituída pelos seus maiores e que ele era, ainda, um ramo da família do Padre José Teixeira, vigário da Nagosa, ao qual foi concedido, em vinte de abril de mil setecentos e quarenta e cinco, brasão de armas dado à família de Teixeiras, Ferreiras e Barbudas, o qual brasão ele testemunha por vezes tem visto e, por isso, sabe que dele consta o que leva dito, designando-se até dele o livro do registo e as folhas a que se refere o justificante; que, pelo ver, sabia que o justificante é proprietário rico e reputado como nobre, servindo sempre os lugares nobres da República, e não lhe consta ter ele cometido crime de qualidade alguma e, menos ainda, de lesa-majestade, divina ou humana, e outro tanto diz de seus maiores pelo ouvir dizer publicamente, sem fama em contrário. E mais não disse. E assinou com o juiz. Daniel José da Silva Melo, o escrevi. Barreto. Francisco Gomes de Carvalho.

Segundo se continha e declarava e era outrossim conteúdo, escrito e declarado em a dita justificação, que sendo assim feita, do modo que dito fica e dos autos consta.

Dos mesmos, outrossim, mais se via e mostrava que, fazendo-se conclusos, se proferiu sentença, da qual todo o seu teor é pela maneira seguinte:

Julgo justificado todo o deduzido nos itens de folhas duas, à vista dos depoimentos concordes e contestada suposição ex folhas cinco. Isto para todos os efeitos de direito e por minha definitiva sentença, a que interponho judicial decreto e mando se cumpra. Pague o justificante as custas ex causa e se lhe dê instrumento. Lisboa, a primeiro de abril de mil oitocentos quarenta e três. João de Campos Pereira Barreto.

Segundo se continha e declarava, era outrossim conteúdo, escrito e declarado em a dita e mencionada sentença, que sendo assim dada e proferida nos ditos autos, do modo e forma que dito fica. Depois do que logo, por parte do dito justificante, José Inácio de Oliveira Rebelo, me foi pedido e requerido que dos mesmos autos lhe mandasse dar e passar seu instrumento cível justificativo, para com ele tratar do que lhe conviesse. E por seu pedir ser conforme ao julgado, lho mandei dar e passar e é o presente, pelo teor e forma do qual requeiro a todas as sobreditas justiças em o princípio deste declaradas que, sendo-lhes este apresentado, indo ele primeiramente, depois de subscrito por mim, assinado, o cumpram e guardem e façam muito inteiramente cumprir e guardar, assim e da maneira que em ele se contém e declara. E em seu cumprimento e por virtude dele, tanto que apresentado lhes for, se servirão de lhes dar e prestar tanta fé e crédito como aos próprios autos de justificação, donde este foi extraído. E para sua maior autenticidade, lhe interponho minha autoridade ordinária e decreto judicial.

Dado e passado em esta Corte, muito Nobre e sempre Leal Cidade de Lisboa, e feito em ela aos três dias do mês de abril do ano do nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo de mil oitocentos quarenta e três. Vai subscrito por Daniel José da Silva Melo, escrivão de um dos ofícios do Juízo de Direito da Sexta Vara nesta Comarca de Lisboa e seu termo, por mercê de Sua Majestade Fidelíssima, a Rainha, a Senhora Dona Maria Segunda, que Deus guarde.

Pagou-se de feitio deste, na forma do Regimento e por parte do dito justificante, José Inácio de Oliveira Rebelo, a quantia de mil seiscentos e quarenta réis; do selo do papel, trezentos réis; o de assinatura já se pagou o que consta dos autos. E eu, Daniel José da Silva Melo, o subscrevi. Barreto.

[Proferida a sentença, o suplicante pede ao monarca que seja servido passar-lhe o seu brasão:]

Em observância do despacho retro [no processo, o despacho do rei de armas precede os textos seguintes], copiei a petição e Régio Despacho de que ela faz menção, cujo teor é pela maneira e forma seguinte:

PETIÇÃO:
Senhora,
Diz José Inácio d'Oliveira Rebelo, proprietário e administrador da Capela de Nossa Senhora das Mercês, da vila da Granja do Tedo, concelho de São Cosmado, comarca de Tabuaço, que pelo instrumento junto mostra ter justificado a sua nobreza e pertencer-lhe o brasão d'armas das famílias de que descende. Recorre, portanto, a Vossa Majestade para que ordene ao Rei d'Armas Portugal que, tomando conhecimento deste negócio, lhe mande passar o seu respetivo brasão, na forma do estilo. Pede a Vossa Majestade a graça de deferir-lhe como súplica. E receberá mercê. Lisboa, seis d'abril de mil oitocentos e quarenta e três. Como procurador, Jacinto José da Silva.
DESPACHO: Assine o Rei d'Armas Portugal. Paço das Necessidades, em oito de abril de mil oitocentos quarenta e três. Duque Mordomo-Mor.

E não se continha mais em a dita petição e Régio Despacho, que fiel e exatamente aqui trasladei, cujo original entreguei ao Rei d'Armas Portugal, António Gomes da Silva, tudo em virtude do mencionado despacho. E eu, Henrique Carlos de Campos, o escrevi.

[Deferida a petição pelo mordomo-mor em nome de Sua Majestade, o processo é remetido ao rei de armas:]

Ilustríssimo Senhor,

Diz José Inácio d'Oliveira Rebelo que pelo instrumento junto mostra ter justificado a sua nobreza e pertencer-lhe brasão d'armas das famílias de que descende. Recorre, portanto, a Vossa Senhoria para que, à vista da referida sentença e do Régio Despacho também junto, lhe mande passar o dito brasão, na forma do estilo e para este fim. Pede a Vossa Senhoria seja servido deferir-lhe como súplica. E receberá mercê.

[Despacho do rei de armas:]

Autuado e feito depósito, venham conclusos. Lisboa, 9 d'abril de 1843. Gomes da Silva.

[Autuação do escrivão da Nobreza:]

Ano do nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo de mil oitocentos quarenta e três, aos dez dias do mês de abril nesta cidade de Lisboa e no meu escritório, me foi dada a petição e instrumento de justificação de José Inácio d'Oliveira Rebelo, com a petição que dirigiu a Sua Majestade, a qual foi despachada pelo Excelentíssimo Duque Mordomo-Mor, em virtude do despacho do Rei d'Armas Portugal, para o fim de se autuarem estes papéis na forma do estilo e fazerem-se os autos conclusos. Assim o pratiquei, a fim de passar ao mencionado suplicante o seu brasão d'armas por este Juízo da Nobreza. E eu, Henrique Carlos de Campos, o escrevi.

[Despacho do rei de armas:]

Passe ao suplicante, José Inácio d'Oliveira Rebelo, o brasão d'armas que pretende, com as armas das famílias de seus ascendentes, vista a sua justificação e sentença. Lisboa, 11 de abril de 1843. António Gomes da Silva, Rei de Armas Portugal.

[Protocolo de conclusão:]

E os fiz conclusos. E eu, Henrique Carlos de Campos. Campos.

Concluso o processo de justificação de nobreza, passa-se a carta de brasão. O texto seguinte transcrevi de um dos livros, o oitavo (folha 311), em que essas cartas eram copiadas.

Armas de José Inácio de Oliveira Rebelo: partido, o primeiro de azul com três faixas de ouro, cada uma carregada de uma flor de lis de vermelho, alinhadas em banda (Rabelo ou Rebelo); o segundo de vermelho com uma oliveira de verde, frutada, arrancada e perfilada de ouro (Oliveira); por diferença, uma brica de prata com um farpão de verde.
Armas de José Inácio de Oliveira Rebelo: partido, o primeiro de azul com três faixas de ouro, cada uma carregada de uma flor de lis de vermelho, alinhadas em banda (Rabelo ou Rebelo); o segundo de vermelho com uma oliveira de verde, frutada, arrancada e perfilada de ouro (Oliveira); por diferença, uma brica de prata com um farpão de verde.

Dona Maria Segunda, por graça de Deus Rainha de Portugal e dos Algarves d'aquém e d'além-Mar em África, Senhora de Guiné e da Conquista, Navegação e Comércio da Etiópia, Arábia, Pérsia e da Índia. Faço saber aos que esta minha carta de brasão d'armas, de nobreza e fidalguia virem que José Inácio de Oliveira Rebelo, proprietário, me fez petição dizendo que pelo instrumento de justificação de sua nobreza a ela junto, proferido e assinado pelo Juiz de Direito da Sexta Vara da Comarca de Lisboa e seu termo, o Doutor João de Campos Pereira Barreto, Cavaleiro Professo na Ordem de Cristo, subscrita por Daniel José da Silva Melo, um dos escrivães do mesmo juízo, se mostrava que ele é filho legítimo de José António d'Oliveira Rebelo e de Dona Luísa Josefa Lopes d'Oliveira Rebelo, neto por parte paterna de Manuel Dias d'Oliveira Rebelo e de sua mulher, Dona Sebastiana d'Oliveira Rebelo, neto por parte materna de Manuel Lopes d'Oliveira e de sua mulher, Dona Josefa Maria d'Oliveira, e legítimo descendente do Padre José Teixeira, vigário de Nagosa, a quem se concedeu brasão d'armas aos vinte d'abril de mil setecentos quarenta e cinco, assim como do instituidor da Capela de Nossa Senhora da vila da Granja do Tedo, concelho de São Cosmado, comarca do Tabuaço, que ele hoje administra, e que os referidos seus pais, avós e mais ascendentes são pessoas nobres das mesmas famílias dos Rebelos e Oliveiras e, como tais, se trataram sempre à lei da nobreza, com armas, criados e cavalos, sem que em tempo algum cometessem crime de lesa-majestade, divina ou humana. Pelo que me pedia ele, suplicante, por mercê que para a memória de seus progenitores se não perder e para clareza de sua antiga nobreza, lhe mandasse dar minha carta de brasão d'armas das ditas famílias, para delas também usar, na forma que as trouxeram e foram concedidas aos ditos seus progenitores. E visto por mim a dita sua petição e justificação e constar de tudo o referido que a ele, como descendente das mencionadas famílias, lhe pertence usar e gozar de suas armas, segundo o meu Regimento e Ordenação da Armaria, lhe mandei passar esta minha carta de brasão delas, na forma que aqui vão brasonadas, divisadas e iluminadas com cores e metais, segundo se acham registadas no Livro do Registo das Armas da Nobreza e Fidalguia destes meus Reinos, que tem o meu Rei d'Armas Portugal, a saber, um escudo partido em pala, na primeira as armas dos Rebelos, que são em campo azul três faixas de ouro, sobre cada uma sua flor de lis vermelha, postas em banda; na segunda as armas dos Oliveiras, que são em campo vermelho uma oliveira verde, com frutos, perfis e raízes d'ouro; elmo de prata aberto, guarnecido d'ouro; paquife dos metais e cores das armas; timbre dos Rebelos, que é um leopardo de ouro, armado de azul, com uma das flores de lis do escudo na testa; e, por diferença, uma brica de prata com um farpão verde. O qual escudo e armas poderá trazer e usar tão somente o dito José Inácio d'Oliveira Rebelo, assim como as trouxeram e usaram os ditos nobres, antigos fidalgos, seus antepassados, em tempo dos senhores reis, meus antecessores, e com elas poderá exercitar todos os atos lícitos da guerra e da paz. E, assim mesmo, as poderá trazer em seus firmais, anéis, sinetes, reposteiros, telizes e mais divisas, pô-las em suas casas, capelas e mais edifícios e deixá-las sobre sua própria sepultura. E, finalmente, se poderá servir, honrar, gozar e aproveitar delas em tudo e por tudo, como à sua nobreza convém. Com o que quero e me praz que haja ele todas as honras, privilégios, liberdades, graças, mercês, isenções e franquezas que hão e devem haver os fidalgos e nobres de antiga linhagem e como sempre de tudo usaram e gozaram os ditos seus antepassados. Pelo que mando a todos os juízes e mais justiças destes meus Reinos e, em especial, aos meus reis d'armas, arautos e passavantes e quaisquer outros oficiais e pessoas a quem esta minha carta for mostrada e o conhecimento dela pertencer que em tudo lha cumpram e guardem e façam inteiramente cumprir e guardar como nela se contém, sem dúvida nem embargo algum que a ela seja posto, porque assim é minha mercê. A Rainha o mandou por António Gomes da Silva, Cavaleiro Professo na Ordem de Cristo, Oficial Menor e Tesoureiro de sua Real Casa e seu Rei d'Armas Portugal. E pagou, em conformidade do artigo décimo, parágrafo primeiro, do Decreto de vinte e oito d'outubro último, duzentos mil réis de direitos de mercê da presente carta de brasão d'armas, como fez constar pela Cautela de Tesouro Público número oitocentos e quarenta, assinada pelo Depositário da Caixa de Papéis de Crédito António Joaquim Dias Braga. Henrique Carlos de Campos, encartado no ofício de Escrivão da Nobreza destes Reinos e seus Domínios, a fez escrever e subscrever em Lisboa, aos sete dias do mês de junho do ano do nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo de mil oitocentos quarenta e três. E eu, Henrique Carlos de Campos, a fiz escrever e subscrevi. O Rei de Armas Portugal António Gomes da Silva. E eu, Henrique Carlos de Campos, a fiz registar e assinei. Henrique Carlos de Campos.

Neste exemplo, faltaram sobrenomes para compor uma esquarteladura, daí o partido, ambas as armas correspondentes à linhagem do avô paterno. Na verdade, é curioso que em todo o processo de justificação não se tenha citado de que costado viera ao justificante o sobrenome Rebelo e somente na carta de brasão se fique sabendo que tanto Oliveira como o dito Rebelo lhe foram transmitidos pelo pai e avô paterno.

Isso demonstra que a ordenação do brasão não era automática, mas circunstancial. Trocando em miúdos, não se tratava simplesmente de compor uma esquarteladura com armas correspondentes aos quatro costados do pretendente segundo uma ordem normativa de precedência, mas observar circunstâncias individuais. Segue-se daí que o funcionamento do sistema dependia de uma autoridade que o operasse. Destituída a monarquia, hoje não há sequer como imitar esse sistema.

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