Na igreja, a combinação de peças e figuras com metais e cores tem grande capacidade expressiva.
Durante a pandemia da Covid-19, o arcebispo de Natal e os bispos de Mossoró e Caicó mostraram uma unidade que eu mesmo nunca tinha visto: todas as medidas que visavam à segurança sanitária do povo foram tomadas de comum acordo desde o início até o fim daquele período. E embora os três estejam hoje noutras fases dos seus ministérios, é bom ver que os seus sucessores mantêm esse espírito, graças ao qual se está, por exemplo, estudando a criação de uma sé episcopal em Assu (cf. a postagem de 12/08).
Ao mesmo tempo, cada uma das circunscrições desta província eclesiástica vem de certa história e vive uma realidade particular. Assim, o bispado de Mossoró seguiu uma vocação educativa que partiu do Colégio Diocesano Santa Luzia, passou pelo Seminário Santa Teresinha e chegou ao centro universitário Católica do Rio Grande do Norte (cf. as postagens antecedente e de 26/08). O de Caicó, menor em território e população, conseguiu erigir ao menos uma igreja matriz em cada município que pastoreia e mais de uma em Caicó e Currais Novos (lá oito e cá três). Em contraposição, esses fatores até hoje desafiam a mitra de Natal.
Também a seu modo cada ordinário tem afrontado tais desafios. Dom Heitor de Araújo Sales, nomeado quarto arcebispo por São João Paulo II em 1993, deu prioridade à formação do clero: até o fim daquela década retomou, reformou e ampliou a sede do Seminário São Pedro, que Dom Marcolino Dantas edificara originalmente em 1933, aonde voltaram tanto os estudantes de filosofia como os de teologia. Em reconhecimento desse esforço, a faculdade dessas duas disciplinas que o antigo Instituto de Teologia Pastoral de Natal (ITEPAN) manteve de 2010 a 2018 recebeu o seu nome.
Com efeito, Dom Heitor viera de Caicó, cuja diocese governava desde 1978, quando São Paulo VI o elegera quarto bispo. Lá não só reabriu o Seminário Santo Cura d'Ars, mas em 1987 ordenou o primeiro diácono permanente do Rio Grande do Norte. A iniciativa de formar homens para essa ordem, restaurada pela constituição dogmática Lumen gentium no bojo do Concílio Vaticano II (1964), partira do Monsenhor Ausônio Tércio de Araújo, seu vigário-geral.
Tendo, pois, colhido os benefícios do diaconado permanente no sertão, Dom Heitor resolveu semeá-los na metrópole, onde havia, a propósito, maior necessidade: só a conurbação Natal–Parnamirim saltou de 670 para 837 mil habitantes entre 1991 e 2000. Fundou, portanto, aos 7 de maio de 1995 a Escola Diaconal Santo Estêvão, cuja frutificação é impressionante: atualmente, a arquidiocese de Natal dispõe de 120 diáconos permanentes. A maioria são homens casados e moradores das paróquias onde exercem o seu ministério.
Em 20/07/2021, fiz uma proposta de brasão para a Escola Diaconal Monsenhor Ausônio Tércio de Araújo, em Caicó. Ao ver que a homóloga natalense tampouco possui um, quis estender o fio que venho tecendo do dia 12 para cá. Proponho-lhe, então, em campo de prata uma aspa de vermelho, carregada de um sol e quatro besantes, tudo de ouro, o sol sobrecarregado de um crisma da aspa; timbre: mitra; divisa: Ὡς μάρτυς στεφθείς. Explico.
A aspa e os besantes homenageiam Dom Heitor, que traz as armas dos Araújos, diferençadas pela troca do besante central por outra figura: em campo de prata uma asna de azul, carregada de uma concha aberta do campo, sobrecarregada de uma pérola do mesmo, e quatro besantes de ouro. Ainda que nascido em São José de Mipibu, o irmão mais novo de Dom Eugênio Cardeal Sales descende dos Araújos do Seridó, cuja padroeira é Sant'Ana, assinalada pela concha com a pérola, como nas armas diocesanas. A sé caicoense foi, afinal, a sua primeira.
Não obstante, podem-se igualmente interpretar os quatro besantes como os evangelistas, por isso no centro da aspa, que também sugere uma cruz inclinada, pus o Cristo (ΧΡΙΣΤΟΣ), "o sol nascente do alto" (Lucas, 1, 78). Com efeito, a proclamação do Evangelho é uma das funções mais emblemáticas do diácono, daí que, insolitamente, tenha ideado um lema em grego, a língua do Novo Testamento. Lê-se Hōs mártys stephtheís, significa "Como testemunha coroado" e refere a Santo Estêvão, cujo nome (Stéphanos) quer dizer 'coroa' e tem o título de protomártir, porque foi o primeiro da cristandade. Justamente em sinal do martírio pinto a aspa de vermelho.
Em síntese, os quatro textos convergem, formando uma só Palavra, que tem sido propagada pelo sangue dos mártires desde que, segundo os Atos dos Apóstolos (6; 7, 54–60), apedrejaram Estêvão, um dos sete homens de boa reputação (ándres martyroúmenoi, viri boni testimonii) que os apóstolos tinham escolhido para o atendimento diário da comunidade (diakonía kathēmerinē, ministerium cotidianum). Mas mesmo sem matança, cada cristão — especialmente o diácono — poderá ser coroado em virtude do seu testemunho (martyría). A mitra marca, enfim, a natureza eclesiástica do instituto e a jurisdição arquiepiscopal.
Nenhum comentário:
Postar um comentário