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22/09/22

BICENTENÁRIO DAS ARMAS NACIONAIS: VARIAÇÕES E ERROS

Bicentenário das armas nacionais: variações e erros.

Uma coisa são as alterações que oficial ou oficiosamente sofreram os dois brasões do Brasil independente; outra coisa são as variações que acontecem naturalmente de uma reprodução para a outra, afinal a heráldica é uma arte. Das alterações tratei na postagem anterior; esta convém iniciar discernindo o que é variação e o que é erro.

Exemplar da bandeira nacional conservado no Museu Imperial (imagem disponível no acervo museológico).
Exemplar da bandeira nacional conservado no Museu Imperial (imagem disponível no repositório).

Como a heráldica é, precisamente, uma arte, não será errôneo reproduzir ramos de cafeeiro e tabaco menos ou mais frondosos, para dar um exemplo de elemento presente em ambos os brasões. Porém haverá, sim, erro em pôr dois ramos de cafeeiro, como se vê no exemplar da bandeira nacional conservado sob o n.º RG 1.184 pelo Museu Imperial, do qual diz que foi a derradeira a tremular no Palácio Imperial de Petrópolis. A variação decorre, pois, da moda ou do estilo pessoal, ao passo que um erro constitui uma alteração indevida do brasonamento.

De modo geral, sob a monarquia reproduzia-se o brasonamento por meio da arte visual que fosse, pintura, escultura etc., tal como tem funcionado a heráldica desde a sua sistematização no fim da Idade Média. Daí que às vezes se tomasse bastante liberdade nessa reprodução, como expus nas postagens de 24/07/21 e 26/07/21. É fácil imaginar que um pintor ou escultor de requinte tinha tanto know-how que se permitia trocar o laço nacional pelo colar da Imperial Ordem do Cruzeiro ou acrescentar cetros ou um pavilhão ao conjunto. Isso está no limite da variação; não que se distinguissem pequenas e grandes armas, mas efetivamente se praticavam, como ainda se praticam, esses elementos na emblemática monárquica ocidental.

Exemplar da bandeira nacional conservado no Museu Imperial (imagem disponível no acervo museológico).
Exemplar da bandeira nacional conservado no Museu Imperial (imagem disponível no repositório).

Do mesmo modo, é fácil imaginar que um artesão menos hábil podia facilmente trocar o laço nacional por uma fita vermelha ou inverter os esmaltes da cruz da Ordem de Cristo ao fabricar um exemplar da bandeira nacional, como se vê no conservado sob o n.º RG 1.030 pelo Museu Imperial, do qual o proprietário antecedente diz estava hasteado no Paço de São Cristóvão aquando da queda da monarquia.

Divergências do brasonamento e do padrão das armas nacionais no Decreto-Lei n.º 5.545/1942.
Divergências do brasonamento e do padrão das armas nacionais no Decreto-Lei n.º 5.545/1942.

Em contraposição, sob a república tem-se procurado imitar o padrão que a legislação adota. Neste sentido, é incrível que em plena terceira década do século XXI o governo federal ainda não tenha criado um sistema de identidade visual para si, extinguindo a má prática da marca de gestão. Daí que na papelaria monocromática haja tantas variedades das armas nacionais quantos os órgãos da administração pública federal.

Divergências do brasonamento e do padrão das armas nacionais na Lei n.º 5.700/1971.
Divergências do brasonamento e do padrão das armas nacionais na Lei n.º 5.700/1971.

A própria Presidência da República mais confunde do que esclarece: a webpage sobre as armas nacionais, atualizada em 27 de setembro de 2021, dá primeiro a reprodução constante do anexo n.º 8 da Lei n.º 5.700/1971, a qual foi desenhada segundo o sistema de hachuras, isto é, aquele que distingue cada esmalte por um padrão de traços ou pontos. O problema é que essa reprodução mesma precisa de correção, pois os perfis da estrela e das guardas da espada,  também o seu punho e o resplendor aparecem em branco, o que denota iluminura de prata, quando tudo isso é de ouro, portanto deveria figurar pontilhado. Talvez por isso essa reprodução praticamente não se use: reduzindo-a a dois centímetros ou menos para pô-la num cabeçalho de ofício, vira um borrão.

Depois, o autor do conteúdo, visivelmente desprovido de qualquer rudimento heráldico, simplesmente coloriu a reprodução em hachuras! Ora, ou uma coisa ou a outra: esse sistema foi criado pelo padre Silvester de Petra Sancta em 1638 precisamente por causa da dificuldade de se reproduzirem brasões em cores até o desenvolvimento da informática e, ainda assim, até hoje a chamada impressão colorida continua a ser muito mais cara que a monocromática.

Proposta de reprodução das armas nacionais em preto e branco.
Proposta de reprodução das armas nacionais em preto e branco.

A solução para uniformizar a reprodução monocromática das armas nacionais na papelaria oficial é tão singela que constrange dá-la: basta deixar os elementos de metal em branco, desenhados apenas os seus contornos, e pintar de preto todos os elementos de cor. Evidentemente, à medida que for crescendo o uso de documentos eletrônicos, será menos necessária essa espécie de reprodução, já que sem papel o arquivo eletrônico pode facilmente mostrar o padrão do brasão em cores.

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