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20/09/22

BICENTENÁRIO DAS ARMAS NACIONAIS: ALTERAÇÕES

Bicentenário das armas nacionais: alterações.

O começo do Brasil como estado-nação foi tão conturbado quanto o de qualquer outro país americano, mas é indubitável que a permanência do herdeiro da Casa de Bragança e a constituição que ele mesmo, já como monarca, outorgou à nação permitiu que as crises políticas se resolvessem por um longo tempo, o mais longo do nosso direito constitucional. Parece, pois, pacífico que a monarquia caiu quando perdeu a capacidade de resolver essas crises.

Alterações das armas nacionais sob a monarquia.
Alterações das armas nacionais sob a monarquia.

A heráldica reflete isso. Diferentemente de alguns países hispano-americanos, que tiveram vários emblemas nacionais enquanto se uniam ou desuniam e acertavam a forma do estado, o Brasil independente teve apenas dois brasões, um sob a monarquia e o outro sob a república, os quais sofreram alterações pontuais. Sob o primeiro regime, essas alterações foram as seguintes:

  • A coroa real deu lugar à coroa imperial pelo Decreto de 1.º de dezembro de 1822;
  • eventualmente, o laço nacional obedeceu ao disposto no Decreto de 5 de outubro de 1831, passando a carregar uma estrela de ouro;
  • eventualmente, o número de estrelas na orla subiu de dezenove para vinte após a criação da província do Paraná em 1853, tendo a do Amazonas em 1850 sido compensada pela perda da Cisplatina em 1828.

Quanto às armas assumidas pelo governo provisório do Marechal Deodoro da Fonseca em 19 de novembro de 1889, recuso-me a engrossar a infindável lamúria da literatura heráldica nacional contra elas. Pode-se acusar Artur Sauer, o criador delas, de não saber bulhufas de heráldica, mas não se pode negar que à época havia um gosto pela parafernália debaixo e ao redor do escudo: as monarquias com os seus cetros, colares de ordens honoríficas e pavilhões e as repúblicas com os seus louros, bandeiras e outros troféus. A quantidade de ornamentos externos é o maior abuso das segundas armas nacionais do Brasil e o brasonamento, a maior falha do estado nesta matéria.

Alterações das armas nacionais sob a república.
Alterações das armas nacionais sob a república.

Com efeito, quem brasonou as armas nacionais para o Decreto de 18 de setembro de 1822 dominava bem a linguagem heráldica que se usava então em Portugal. Em contraposição, quem lavrou o Decreto n.º 4, de 19 de novembro de 1889, recorreu a uma "estampa anexa" e assim ficou por 52 anos: reproduziam-se as armas nacionais por imitação de um desenho. Foi o Decreto-Lei n.º 5.545, de 4 de setembro de 1942, que pela primeira vez brasonou as armas da República, alterado pela Lei n.º 5.389, de 22 de fevereiro de 1968, que ajustou o número de estrelas na bordadura ao dos estados da União (o antigo Distrito Federal fora elevado a estado da Guanabara em 1960 e o território federal do Acre, em 1962) e trocou o nome oficial do país de Estados Unidos do Brasil para República Federativa do Brasil, ampliada no mesmo ano pela Lei n.º 5.443, de 28 de maio de 1968, que incluiu uma estrela na dita bordadura para representar o Distrito Federal, revogada pela Lei n.º 5.700, de 1.º de setembro de 1971, que fixou o número das estrelas em 22, daí que a Lei n.º 8.421, de 11 de maio de 1992, tenha novamente ajustado esse número ao das unidades federativas, refletindo o desmembramento do Mato Grosso do Sul em 1977, a elevação de Rondônia em 1981, a do Amapá e a de Roraima em 1988 e o desmembramento do Tocantins na mesma data. Eis o ordenamento vigente:

Art. 8.º A feitura das armas nacionais deve obedecer à proporção de quinze de altura por quatorze de largura e atender às seguintes disposições:
I – O escudo redondo será constituído em campo azul-celeste, contendo cinco estrelas de prata, dispostas na forma da constelação Cruzeiro do Sul, com a bordadura do campo, perfilada de ouro, carregada de estrelas de prata em número igual ao das estrelas existentes na bandeira nacional.
II  O escudo ficará pousado numa estrela partida-gironada, de dez peças de sinopla e ouro, bordada de duas tiras, a interior de goles e a exterior de ouro.
III  O todo brocante sobre uma espada em pala, empunhada de ouro, guardas de blau, salvo a parte do centro, que é de goles e contendo uma estrela de prata, figurará sobre uma coroa formada de um ramo de café frutificado, à destra, e de outro de fumo florido, à sinistra, ambos da própria cor, atados de blau, ficando o conjunto sobre um resplendor de ouro, cujos contornos formam uma estrela de vinte pontas.
IV  Em listel de blau, brocante sobre os punhos da espada, inscrever-se-á em ouro a legenda República Federativa do Brasil no centro e ainda as expressões 15 de Novembro na extremidade destra e as expressões de 1889 na sinistra.

Anexo n.º 2 do Decreto n.º 4, de 19 de novembro de 1889.
Anexo n.º 2 do Decreto n.º 4, de 19 de novembro de 1889.

O redator do Decreto-Lei n.º 5.545/1942 foi Gustavo Barroso, diretor do Museu Histórico Nacional, que não empregava a linguagem heráldica portuguesa, mas preferia a nomenclatura espúria goles, blau, sablesinople/a e era adepto de certo exagero descritivo, os quais a sua Introdução à técnica de museus (1946) difundiu muitíssimo no Brasil. Olhando o desenho publicado no primeiro fascículo dos Decretos do governo provisório (1890), brasono-o assim:

  1. De azul com cinco estrelas de prata, postas como a constelação do Cruzeiro do Sul, e uma bordadura de azul, perfilada de ouro, carregada de vinte estrelas de prata;
  2. o escudo, redondo e perfilado de ouro, é suportado por uma estrela gironada de dez peças de verde e ouro e perfilada de duas peças de ouro e vermelho;
  3. sob a estrela, uma espada de prata, com o escudete de vermelho, carregado de uma estrela de prata, as guardas de azul, perfiladas de ouro, o punho do mesmo e o pomo de prata;
  4. o conjunto é suportado por dois ramos, um frutado de cafeeiro à destra e o outro florido de tabaco à sinistra, ambos de sua cor, atados de azul sob a empunhadura da espada;
  5. abaixo, sobreposta ao punho da espada, a legenda ESTADOS UNIDOS DO BRAZIL e as datas 15 de Novembro, à destra, e de 1889, à sinistra, escritas de ouro em listel de azul;
  6. o todo é suportado por um resplendor de vinte pontas de ouro.

Além das diferenças na percepção do ordenamento e, consequentemente, no brasonamento, há um elemento sempre divergente: a espada. É tão complicada que o decreto-lei de 1942 não brasona exatamente a que se vê no decreto de 1889 e o padrão que a Presidência da República adota não obedece de todo à lei de 1971.

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