As cores heráldicas são também úteis para dar aos cidadãos uma bandeira diferente da estatal.
Mônaco era um desses senhorios de antigo regime que o Congresso de Viena (1814-15) restituiu a quem o possuía após a ocupação pela França revolucionária e imperial. E como permanece até hoje na forma de uma monarquia constitucional, as suas bandeiras ilustram outra utilidade das faixas de cores heráldicas.
Bandeira de Mônaco. |
No século XIII, Mônaco (1) nomeava um penedo e porto natural, onde Gênova levantou uma fortaleza. Em meio à luta dos guelfos e gibelinos pelo domínio dessa república, a Casa de Grimaldi apossou-se da fortaleza e governou-a desde meados do século seguinte, quando adquiriu também as vilas de Roquebrune e Menton. Esses três senhorios estavam dentro do Sacro Império sob a suserania do conde da Provença, mas como esse condado se uniu à França em 1481, os Grimaldi de Mônaco tornaram-se soberanos.
No entanto, durante todo esse período Gênova reocupou Mônaco algumas vezes, à medida que a situação política da república se rearranjava. Daí que em 1524 Honorato I tenha firmado um tratado com o imperador Carlos V, pelo qual Mônaco se tornou um protetorado da Coroa espanhola. Talvez por essa fragilidade, seu neto, Honorato II, tomou o título de príncipe em 1612 e trocou a proteção espanhola pela francesa em 1641. Após o dito Congresso de Viena, mais precisamente em 1817, o protetorado foi assumido pela Casa de Saboia. Mas ante a unificação italiana, em 1861 o príncipe Carlos III assinou com o imperador Napoleão III um tratado novo, que reconheceu a independência de Mônaco em troca da cessão de Roquebrune e Menton à França, compensada, além disso, por uma paga pecuniária. Essas cidades tinham-se declarado livres sob a proteção da Coroa sarda no bojo da Primavera dos Povos, em 1848.
Bandeira principesca de Mônaco. |
Não é, pois, de se estranhar que Mônaco tenha adotado as suas bandeiras tardiamente, em 1881. Nesse ano, o mesmo Carlos III passou uma ordenação estabelecendo dois pavilhões: um civil, tem duas faixas horizontais, uma vermelha e a outra branca, as cores da Casa de Grimaldi; o outro estatal, é branco com o brasão dessa casa no centro. Até hoje, é a norma vigente nessa matéria, citada no artigo 7.º da Constituição de 1962.
Armas da Casa de Grimaldi (imagem disponível no portal do Palácio Principesco). |
As armas dos Grimaldi são, desde sempre, um fuselado de prata e vermelho. A casa principesca traz, ademais, os ornamentos seguintes: em volta do escudo, o colar da Ordem de São Carlos; por tenentes, dois frades menores empunhando uma espada levantada; por divisa, Deo juvante, tudo ao natural sobre um manto de vermelho, forrado de arminhos e rematado pela coroa principesca (2). Cabe observar que a varonia dos Grimaldi monegascos se quebrou por duas vezes, em 1731 e 1949, mas em ambas as ocasiões se impôs a continuidade do nome e das armas.
Mônaco foi, extraordinariamente, uma monarquia absoluta até 1911 e as suas bandeiras refletem isso. Numa concepção próxima ao Antigo Regime, em que o estado se confunde com a Coroa, a bandeira de cores heráldicas serviu para representar a cidadania, enquanto a bandeira com o brasão está reservada ao príncipe, à sua casa e ao estado, ambas tanto na terra como no mar.
Uma desvantagem das bandeiras de cores heráldicas, mormente das mais singelas, é a coincidência: ressalvadas as diferentes proporções e tonalidades, bicolores vermelhas e brancas são igualmente as bandeiras da Indonésia; do estado alemão de Hesse; dos estados austríacos de Salzburgo, Viena e Vorarlberg (3); do departamento boliviano de Tarija e do cantão suíço de Solothurn.
(1) O nome nativo de Mônaco é Mónego (pronunciado /'muneɡu/) em genovês e Mónegue (pronunciado /'muneɡe/ em provençal (daí o gentílico monegasco), ambos do latim Monœcus. A forma italiana Monaco (proparoxítona), adotada em francês (com acento oxítono), foi seguramente influenciada pela lenda segundo a qual Francisco Grimaldi se disfarçou de monge (monaco em italiano) para penetrar a fortaleza genovesa em 1297. Essa lenda está figurada no brasão monegasco.
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